Bom Despacho - Cidade da Senhora do Sol Busca Contato Ajude Você Também

 

[início] - [cultura]

Um linguajar que sobrevive ao tempo

Gíria (Língua) da Tabatinga
Elo Perdido - Boletim da UFMG
Fiotinha e a Língua da Tabatinga
D.Fiota: a letra e a palavra
Dialetos Africanos falados em Minas Gerais
Poema Gente da Tabatinga
A língua da Tabatinga na Literatura de Jorge Fernando
Pé preto no barro branco - livro de Sônia Queiroz
Dicionário - Autoria de Comodoro e Benício Cabral
Localização da Comunidade Quilombola

Links Interessantes
Contribua você também, mande fotos e textos para preservar a história da Língua da Tabatinga, clique aqui e fale conosco

 

O elo perdido

Experiência do projeto Minas Afro-descendente comprova o poder da língua em unir culturas separadas pela escravidão

Maurício Guilherme Silva Jr.

Sexta-feira, 13 de agosto. Quase lua nova em Bom Despacho, município do oeste mineiro. Em sua pequena casa na Tabatinga, bairro tradicional da cidade, dona Maria Joaquina da Silva, a Fiota, prepara-se para dormir. Tudo corre em sua aparente normalidade cotidiana, até que a noite proporciona-lhe um surpreendente encontro. Por volta das 21 horas, a moradora recebe três ilustres visitantes, com quem a mera troca de palavras faz com que dona Fiota reavive séculos da história de seus antepassados.


Remanescente de uma das duas famílias* de Bom Despacho detentoras da tradição lingüístico-cultural africana, Maria Joaquina conversou com seu Crispim e seu Ivo, cantadores de vissungos _ cantos afro-brasileiros _ de Milho Verde, e com o estudante angolano da UFMG, Amadeu Chitacumula. Depois de se cumprimentarem em português, dona Fiota pronunciou frases no dialeto que aprendera com a mãe: a língua do Negro da Costa ou da Tabatinga.

A cada expressão ou palavra dita pela anfitriã, seus convidados não disfarçavam a emoção. Apesar de nascidos em terras distantes da pequena Bom Despacho, Ivo, Crispim e o jovem estudante angolano entendiam tudo o que dona Fiota dizia. Enquanto os cantadores sorriam surpresos, Amadeu Chitacumula traduzia etmologicamente a origem das expressões de Maria Joaquina e comparava determinadas pronúncias com dois dos dialetos angolanos: o quimbundo e o umbundo.

O encontro dos representantes da cultura afro-brasileira aconteceu em Bom Despacho por causa do evento Minas afro-descendente - Uma experiência de revitalização de remanescentes de línguas africanas em Minas Gerais, fruto de projeto da Faculdade de Letras da UFMG, coordenado pela professora Sônia Queiroz (leia entrevista ao lado), que busca revitalizar as línguas africanas faladas no Brasil. No dia seguinte ao encontro de dona Fiota com seus novos amigos, a cidade mineira seria palco de uma série de atividades artísticas e folclóricas

Origens

A língua da Tabatinga, que Dona Fiota apresentou a seus visitantes, mistura o português rural do Brasil-Colônia a línguas de grupos Banto – com predomínio do quimbundo e do umbundo –, faladas até hoje em Angola. Segundo a professora Sônia Queiroz, a formação de dialetos em solo brasileiro resulta da necessidade de sobrevivência dos escravos. À época, os senhores misturavam, propositadamente, nas senzalas, negros vindos de pontos diferentes da África. Como não conseguiam se comunicar, precisaram desenvolver um dialeto próprio, que lhes servia de instrumento para o diálogo e, ao mesmo tempo, de afronta aos patrões brancos.


Com relação ao surgimento da língua falada por clãs afro-brasileiros de Bom Despacho, a professora Sônia Queiroz, no livro Pé preto no barro branco: a língua dos negros da Tabatinga, remete ao ciclo da mineração. Segundo ela, os escravos que ali chegaram teriam vindo de Pitangui, uma das vilas do ouro, bem mais antiga que Bom Despacho. “Quando as minas de Pitangui começam a escassear, os habitantes da região migram para outras áreas do oeste mineiro. O processo culmina com o desenvolvimento de fazendas de gado, onde trabalhavam os negros que formaram as famílias da Tabatinga”, explica a pesquisadora. Quando passam a realizar serviços domésticos no interior da casa de seus senhores, os escravos agregam estruturas do português à língua criada nas senzalas.

* Em 1981, havia em Bom Despacho 207 falantes da chamada Língua do Negro da Costa _ ou Língua da Tabatinga _ pertencentes a duas famílias do município. Passados mais de 20 anos, a professora Sônia Queiróz identificou em suas pesquisas apenas duas mulheres da comunidade. Delas, apenas Maria Joaquina da Silva fala a língua afro-brasileira. O idioma é composto por um português rural do Brasil-Colônia e por línguas do grupo Banto, com predomínio do quimbundo e umbundo, faladas até hoje em Angola.

Minha pátria é minha língua

Realizado no adro da capela da Cruz do Monte, no dia 14 de agosto, na comunidade da Tabatinga, o evento Minas Afro-descendente buscou reforçar a identidade dos afro-descendentes que vivem em Minas Gerais, por meio do reconhecimento do valor de suas tradições lingüísticas e culturais. Pretendeu, ainda, valorizar a mistura de etnias – raças, cores, línguas, estilos de vida – que caracteriza a riqueza da cultura rasileira.
O evento reuniu diversas vertentes afro-brasileiras. Logo às 10 horas, dezenas de moradores assistiram à chegada dos ternos do reinado de Nossa Senhora do Rosário, grupos compostos por homens e mulheres devidamente paramentados com cores de sua comunidade, que dançam ao ritmo de tambores, sanfonas, e seguram bandeiras com homenagens aos santos de devoção.

Em seguida à passagem dos ternos, o estudante Amadeu Chitacumula e outros quatro estudantes angolanos da UFMG mostraram aos participantes a força da musicalidade africana. Integrantes do grupo Dikanza – termo que, em quimbundo, é representativo de instrumentos musicais –, eles apresentaram, à capela, canções de sua terra natal. Vindos de diversas partes de Angola, Chitacumula e seus companheiros estão há alguns anos longe de seu país. O português é a língua oficial dos estudantes, mas são os dialetos que denunciam sua origem, num processo que pode ser resumido pela expressão Ofexa yange elimi liange, (Minha pátria é minha língua).

Outra atração do evento foi o grupo belo-horizontino Tambolelê, que apresentou, ao lado dos cantadores de vissungos de Milho Verde, o espetáculo Macuco Canengue. “Foi uma honra nos apresentarmos ao lado de dois mestres. Afinal, há anos trabalhamos com a difusão da cultura afro-mineira”, diz o músico Sérgio Pererê, um dos integrantes do Tambolelê. Seu Ivo e seu Crispim explicam que os vissungos são cantos entoados pelos negros durante a lida diária e nos cortejos fúnebres. “Quando morre uma pessoa, rezamos o ofício e entoamos cantos sagrados”, afirma seu Crispim. Atualmente, a tradição foi deixada de lado na região em que moram nas proximidades de Diamantina. A expressão artística do canto, no entanto, permanece viva.

Fonte: Boletim Informativo da UFMG
http://www.ufmg.br/boletim/bol1451/quarta.shtml

Divulgue nossa cidade

Copie o banner abaixo para o seu site e ajude a divulgar a cidade de Bom Despacho/MG.

Após copiar o banner, coloque um link direto para http://www.bomdespachomg.com.br.

Localização da Comunidade


localizacao tabatinga bom despacho

clique para ver a localização do bairro Tabatinga em Bom Despacho / MG

Associação Quilombola

A pretensão da Associação dos Quilombolas de Bom Despacho é a de iniciar seus trabalhos de filiação, divulgação e possíveis parcerias para a difusão e implantação dos projetos ligados às causas da mesmo o mais rápido possível.

Telefone de contato: (37)3522-3324

Endereço: R. Tabatinga. 520, bairro Ana Rosa,no município de Bom Despacho/MG

Língua (Gíria) da Tabatinga

A gira (língua, gíria)da Tabatinga é uma língua afro-brasileira, de origem predominantemente banto. Em extinção, é falada em parte do município brasileiro de Bom Despacho.

fonte: Wikipedia

Dona Fiota: A letra e a palavra

Texto de: José Ribamar Bessa freire


Dona Fiota. Ela é dona Fiota e pronto. Ninguém a conhece pelo nome de Maria Joaquina da Silva. Mas também quem é que chama
Tiradentes de Joaquim José da Silva? Basta uma única conversa para perceber que dona Fiota é uma mulher poderosa, um personagem da história do nosso país. Tive o privilégio de ouvi-la em março de 2006, em Brasília, durante o seminário sobre as línguas faladas no Brasil, organizado pela Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados e pelo IPHAN. Com seu charme e sua inteligência, ela cativou a todos.
Dona Fiota contou, naquele seminário, que seu pai era um baiano que vivia andando pelo mundo, no tempo do final da escravidão, que ele passou pelo centro-oeste de Minas Gerais, que foi passando e viu sua mãe no cativeiro trabalhando, fiando fio de algodão, que acenou para ela e perguntou se não arrumava uma ocupação para ele, que acabou conseguindo um serviço na roça de mandioca, que foi ficando e namorando, ficando e namorando, até que os dois se casaram, tiveram filhos, netos, bisnetos.
Os descendentes do andarilho baiano com a ex-escrava se organizaram depois de abolida a escravidão: “Quando rebentou a liberdade, minha mãe saiu lá de Engenho do Ribeiro caçando um lugar. Chegou aqui. Tudo era mato. Na subida, havia um barro branquinho. Ai foi minha mãe que deu o nome de Tabatinga. Toda vida foi Tabatinga. Desde o tempo da escravidão. Só agora é que o nome mudou pra Ana Rosa. Quero tirar esse nome de Ana Rosa”.
A história da comunidade Tabatinga - hoje uma área quilombola, situada no bairro Ana Rosa, periferia da cidade de Bom Despacho (MG) - foi contada por Dona Fiota aos participantes do seminário do IPHAN, mas teve de ser traduzida, porque ela falou, não em português, mas numa língua afro-brasileira, de origem banto, chamada Gira da Tabatinga, ainda hoje usada por um grupo de moradores. Foi a primeira vez que o plenário da Câmara Federal ouviu o som de uma língua minoritária de base africana, reconhecendo sua riqueza, sua função histórica e sua legitimidade.

A fala da senzala
A Gira da Tabatinga era falada nas antigas senzalas das fazendas do interior de Minas Gerais. Com ela, os escravos podiam se comunicar livremente sem o patrão entender o que diziam. A língua libertava. Dona Fiota conta: “A gente não podia falar o nome do trem. Tem assango? Não, não tem assango. Tem cambelera? Não, cambelera também não. Tem caxô? Nada de caxô. Então, minha mãe falava: ‘Catingueiro caxô. Caxô o quê? No Curimã’. Ela tava avisando que o patrão havia chegado”.

Numa entrevista a Lúcio Emílio, Dona Fiota dá detalhes sobre a formação da Gira da Tabatinga, produto do sincretismo de várias línguas africanas misturadas ao português: “Aprendi essa língua com a minha mãe. Ela falava todo dia para mim até eu aprender. Isso traz toda uma história pra gente, tanto das partes alegres, como das tristes”. Recentemente, os moradores perceberam que aquela língua que os havia libertado, estava ameaçada de extinção, porque não é mais usada por crianças e jovens, diz dona Fiota: - “Aqui no bairro é muito difícil quem fala a língua”.

Foi aí que a comunidade decidiu fortalecer na sala de aula a língua denominada Gira da Tabatinga, aproveitando a lei sancionada em 2003 que torna obrigatório o ensino de História e Culturas afro-brasileiras nas escolas de ensino fundamental e médio. Duas pesquisadoras – Celeuta Batista Alves e Tânia Maria T. Nakamura – acompanharam a luta pela revitalização da língua, que no passado foi um poderoso instrumento de resistência dos escravos e hoje é uma marca da identidade de seus falantes.
A comunidade conseguiu a promessa de que a Secretaria Municipal de Educação remuneraria uma professora da Gíria da Tabatinga. A questão era: - quem daria aulas? Os moradores não duvidaram: - dona Fiota. Afinal, ela era o Aurélio, o Antônio Houaiss daquela língua quilombola. Acontece que após um mês de trabalho, quando foi receber, o funcionário lhe disse:- “Ah, a professora é a senhora? Então, não vou pagar. Como justifico o pagamento a uma professora que é analfabeta?”. Dona Fiota deu uma resposta de bate-pronto, que só os sábios podem dar:
- Eu não tenho a letra. Eu tenho a palavra.

A dona da palavra
Com isso, derrubou a postura quase racista que discrimina os que vivem no mundo da oralidade. Ensinou que existe saber sem escrita; que na situação em que ela, dona Fiota, se encontra, não precisa da letra, porque usa a palavra para transmitir seus saberes, trocar experiências e desenvolver suas práticas sociais. Foi nessa língua de forte tradição oral que ela criou e educou seus filhos. É nela que hoje pensa, trabalha, narra, canta, reza, ama, sonha, sofre, chora, reclama, ri e se diverte. Dona Fiota deixou claro que não é carente de escrita, como dizem alguns letrados. Ela é independente da escrita.
Cerca de um milhão e meio de brasileiros para quem o português não é a língua materna estão, hoje, na situação de dona Fiota. Falam uma das 210 línguas existentes dentro do território nacional, 190 das quais são línguas indígenas, ágrafas, sem tradição escrita, mas que são depositárias de sofisticados conhecimentos no campo das chamadas etnociências, da técnica e das manifestações artísticas.

- Esses cidadãos não são menos brasileiros que os outros – defende o lingüista Gilvan Muller, que além dos direitos das minorias, chama a atenção para a diversidade cultural e lingüística, tão importante para o país e para a humanidade. Por isso, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), atendendo encaminhamento do então presidente da Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados, Carlos Abicalil, organizou o seminário em 2006 para discutir como proteger essas línguas e o rico patrimônio intangível que elas representam.
Desse seminário participaram técnicos, especialistas e falantes de diversas línguas, entre as quais o Guarani, o Nheengatu, a Língua de Sinais (Libras) e até uma variedade do alemão falada no sul do Brasil chamada Hunsrückisch. Na ocasião, foi criado um Grupo de Trabalho Interinstitucional, formado por cinco ministérios, uma ONG e uma entidade internacional, que produziu um relatório sobre como registrar essas línguas e proteger a diversidade lingüística do país.

Agora o relatório vai ser discutido. Nessa próxima quinta-feira, 13 de dezembro, em Brasília, haverá uma Audiência Pública da Diversidade Lingüística do Brasil, organizada pela Comissão de Educação da Câmara dos Deputados e pelo IPHAN. Tomara que dona Fiota, a dona da palavra, esteja lá outra vez. Em caso afirmativo, voltarei a ouvi-la e conto tudo no próximo domingo.
Postado em 10/12/2007 ás 11:39

Links Interessantes

Site MG QUILOMBO - http://www.mgquilombo.com.br

Fundação Cultural Palmares - http://www.palmares.gov.br

 

 

 

Início A Cidade PesquisaCultura História Turismo Ação Social Empresas Ajude Você Também


Política de Uso & Copyright Fale Conosco Créditos
... © 2002-2010 (8 anos no ar!)

Bom Despacho - Minas Gerais - Brasil