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O TORMENTO DE SÍSIFO
II - BAGDÁ À VISTA

por Vicente de Paulo Teixeira Leite

E m edição anterior deixa-mos Sísito animado pela “Cidade de Deus” para rolar a pedra montanha acima para, a partir da barbárie, reconstruir a Cidade dos Homens.
É que novo vento já sopra da Galiléia, uma onda de amor, solidariedade, fraternidade combinados com a construção de uma nova civilização conduzindo-a ao surgimento das universidades, dos estados racionais, aos grandes descobrimentos, às artes e ciências. Foi um renascer, o Renascimento. Grandes figuras, entre elas o holandês Hugo Grotíus, que refletiu sobre a criação dos Estados, criando o Direito Internacional sublinhando a sacrossantidade dos tratados, dos embaixadores etc.
O final do sec. XVIII, foi marcado por um fator. A Revolução Francesa e a Revolução Americana. E na esteira da Revolução Francesa Napoleão Bonaparte. Bonaparte bagunçou o mapa da Europa.
Derrotado Napoleão, em 1815, os vencedores se reuniram em Viena, Áustria, para reocupar a Europa. E por inspiração da Rússia criaram a Santa Aliança com a meta de evitar qualquer movimento de revolução liberal no mundo mediante, inclusive, intervenção armada. Formavam a Santa Aliança, a Áustria, a Rússia, a Prússia, a Inglaterra e Portugal (o Brasil aparece aí, pela primeira vez, na política internacional. Depois... foi vítima da Santa Aliança). A Santa Aliança, mergulhada em suas contradições, foi se esgarçando e desapareceu da História.
O sec. XIX, apesar do esplendor da Revolução Industrial - “ admirável espetáculo do progresso humano”, segundo John Keyner - foi uma marcha fúnebre para o Armagedon. A busca do carvão-de-pedra, o nacionalismo desenfreado; tudo isso leva Bismarck a cunhar o termo “Weltpolitik”, que, hoje, traduzimos por Geopolítica. O ódio franco-prussiano chega ao apogeu. Se eu chegasse à casa de um francês, não precisava perguntar o nome: o cachorro se chamava: “Bismarck”, se fosse na casa de um alemão, também: o cachorro se chamava “Napoleon”. O ódio franco-alemão, a concorrência comercial, fruto do progresso industrial voltado para a colônia do novo colonialismo europeu, voltado para a África e a Ásia, o nacionalismo exacerbado, sistema de alianças preventivas e armamentista, tudo isto apontava para um desastre final. Bastou um ato, um crime a ser apurado pela polícia - o assassinato do príncipe herdeiro da Áustria - para que todos os países da Europa e alguns fora da Europa, como aquele brinquedo dominó em que pomos peças em pé e derrubamos a primeira e vão caindo todas, uma a uma, todas entraram em guerra: foi a primeira guerra mundial em 1914.
Poucos anos antes da guerra, Henry Ford aplicou aos automóveis a técnica da produção em série. Com isto, aumentava muito a utilização industrial do petróleo nos motores de explosão. E, ao fim da guerra, por inspiração do presidente dos EEUU, Wilson, criou-se a Liga da Nações, com sede em Genebra, para resolver os conflitos internacionais e promover a paz. Para o Oriente Médio e Próximo, desde séculos focos de conflitos e brigas, a Liga das Nações criou os Protetorados, especialmente entre os dois Orientes, dividindo-os entre os grandes vencedores, a França e a Inglaterra que já viam a importância destas regiões pela abundância das reservas de petróleo. As nações “protetoras”, vencedoras da 1ª guerra, estabeleceram e mantiveram na mesma região do Oriente, extremamente divididos, regimes autocráticos, quase estilos tribais, focos de constantes conflitos.
De outro lado, os idealizadores da Liga da Nações, sob a desculpa da política do isolacionismo (a Europa para os europeus e a América para os americanos), abandonaram a Liga que foi, assim, enfraquecendo. Vieram a crise econômica de 1929, a ascensão dos regimes totalitários - o fascismo na Itália; o nazismo na Alemanha; o militarismo no Japão - e, 20 anos após o final da 1ª Guerra, estourava, em 1939, a Segunda Guerra Mundial. Foram seis anos de horror, de massacre, de mortes coroados, ao final com dois medonhos cogumelos: um sobre Nagasaki, outro sobre Hiroshima: a bomba atômica.
É preciso recomeçar, Sísifo! Em S. Francisco (EEUU) a conferência das nações do mundo criaram a ONU. Destinada não só a resolver conflitos internacionais, mas também, orientar as nações nos diversos setores da atividade humana. O núcleo central da ONU é o Conselho de Segurança, instância suprema dos conflitos internacionais.
A União soviética descobriu os segredos da bomba atômica. O mundo fora dividido em duas zonas de influência: EEUU X URSS. E o medo garantiu a esperança. A ONU intermediando a esperança. Mas a URSS se desfez. E um filósofo americano, Fukoyama, exclamou: “chegamos ao fim da História”. Está estabelecida a hegemonia absoluta dos EEUU no mundo globalizado.
Aconteceu o 11 de setembro. Bush, que capengava sob o peso da duvidosa eleição e o fracasso da primeira guerra do Golfo, esfregou as mãos. Está aí a chance com os dividendos do petróleo. “Guerra contra o terror!” E a ONU, o Conselho de Segurança? - Que se afumentem.
Vimos o que vimos. Não defendo Saddan Hussein. Um ditador cruel, sangüinário, sem dúvida. Minha dúvida está em: vale a pena derrubar, estupidamente, um ditador de um pequeno país e criar um ditador, igualmente estúpido para o mundo inteiro?
A queda de Bagdá, a cidade dos Califas, das “Mil e Uma Noites”, a “Cidade da Paz” arrasada, seus filhos mortos, seus tesouros milenares entregues ao saque - novas barbáries vindas do Norte - e de outro lado, os poços de petróleo preservados pelas tropas de ocupação.
No fundo do Inferno de Dante Alighieri, eu me encontrei com Sísifo e, como o poeta, eu lhe perguntei:
“E agora, José?”
Ele me respondeu como outro poeta:
“Senhor Deus dos desgraçados,
Dizei-me, ó Deus, se eu deliro ou é verdade
Tanto horror diante dos céus”
E continuou:
“Vamos recomeçar. Vamos arrastar a pedra montanha acima. Há um país. Ele tem a forma de liqüidificador. Todas as raças, nele, se misturam. Vivem em paz. Esse país era um “gigante deitado eternamente em berço esplêndido.” Mas parece que esse gigante está acordando. Este país é o Brasil.


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Prof. Vicente de Paulo Teixeira Leite
Advogado e Professor Emérito da Escola
Estadual “Miguel Gontijo”
Bom Despacho

 

 

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