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Relatos sobre Picão Camacho

por Tarcísio J. Martins

“Pitangui, a partir de 1720, ou talvez até um pouco antes, fundada e ocupada por uma constelação de aventureiros, foragidos, frades e padres, mocambeiros (mestiços e negros fugidos) etc., passou a ser o centro de onde se irradiaram inúmeras expedições de procura de ouro, de devassamento e de povoamento de nossa região. Neste sentido, sobre as origens de Bom Despacho, nosso Laércio registra fato narrado pelo octogenário Nicolau Valério Filho ao Monsenhor Vicente Soares, segundo o qual, quando o revoltoso Domingos Rodrigues do Prado se retirava para Goiás, teria acampado com sua gente em nossa região, sendo, por isto, considerado o fundador de Bom Despacho. Inclusive, por ter ele prosseguido viagem abrindo picadas e devastando matas, deram-lhe o apelido de “Picão Camacho”, razão do nome do rio Picão, próximo a Bom Despacho. Laércio Rodrigues lança luzes sobre o assunto, que podem eliminar esta versão, conforme veremos mais adiante[1]. Moema, pgs. 44/45
“Registra a “Enciclopédia dos Municípios Brasileiros” que “foi um português, genro do bandeirante paulista Antônio José Velho, chamado Manoel Picão CamaCHO, que primeiro se internou em terras que constituem o atual município de Bom Despacho, onde se fixou, isto, por volta de 1730”[2].

Até pouco tempo, tive como certo que o historiador Laércio Rodrigues, salvo melhor interpretação, esclarecera quase que totalmente esta questão. O nome verdadeiro do homem, segundo ele, era Manoel Picão CamaRGO e não CamaCHO; sua nacionalidade, brasileira e não portuguesa ou espanhola; era cunhado, e não genro, do Velho da Taipa. Neste sentido, teria sido um dos companheiros do Velho Taipa em suas expedições para nossa região, no entanto, uma de suas filhas, Damiana, mudou seu nome para Joana Maria Bicudo, excluindo o nome de seu pai, o qual, também, misteriosamente, não consta do “Dicionário de Bandeirantes e Sertanistas do Brasil”. Para explicar este fato, Laércio Rodrigues conta-nos que existe estória que há muito contam, segundo a qual, em visita a um amigo, o garimpeiro Manoel Picão Camargo viu sobre a mesa da sala do amigo um baita diamante que o simplório pensava que fosse pedra sem valor. Então, fingindo que a pedra realmente não valia nada, Picão Camargo pediu ao amigo que lhe desse a pedra para servir-lhe de prendedor de papéis. O amigo bobalhão deu-lhe a pedra e ele foi-se embora para Portugal, de onde nunca mais voltou para o Brasil[3].

Já na primeira edição deste livro, registrei que achava pouco convincente a história supracitada. Neste sentido, o fato é que Damiana, filha de Manoel Picão Camargo, antes de se casar com o reinol José Dias Maciel (nascido na Freguesia de Nossa Senhora do Monte Serrate, na vila de Viana, Arcebispado de Braga/Portugal), poderia ter mudado o seu nome por outras razões, a exemplo de se envergonhar de seu pai que teria abandonado sua mãe, ou por ter cometido algum crime - pode ter sido realmente companheiro do revoltoso Domingos Rodrigues do Prado - ou pelo simples fato de não ter tido sucesso em seus garimpos e, pobre, ter voltado para São Paulo. Este português José Dias Maciel é tronco da linhagem dos Maciel, família de muito poder político de onde, entre outros, saíram políticos como Olégario Maciel, presidente do Estado de Minas Gerais.

Apesar de não sentir mais tanta certeza na tese do Dr. Laércio Rodrigues, não tenho, ainda, nenhuma versão melhor que a sua para o fato supra. Vale ressaltar que Picão significa picareta, alvião e almocafre (instrumentos de mineração) e que Camacho, significa indivíduo manco ou coxo. Quanto aos nomes Camargo e Camacho, estes, são realmente nomes de paulistas ligados ao Velho da Taipa. Encontramos em Dicionário de Bandeirantes e Sertanistas do Brasil mais atualizado, oito sertanistas com o sobrenome Camacho, todos paulistas, entre os quais se destacam Manoel Fernandes Camacho, irmão de Antônio Bicudo Camacho, filhos de Sebastião Fernandes Camacho e de sua mulher Isabel Bicudo de Brito; em 1675 já estavam em bandeiras pelo sertão, sem haver qualquer outra informação[4].

Consigne-se ainda, a existência, antiquíssima, do topônimo Camacho[5], designando, primeiramente, o Distrito de Nossa Senhora das Dores do Camacho, da Vila de Tamanduá (Itapecirica), elevado a cidade com esse mesmo nome somente em 30.12.1962. Moema, pgs. 46/47


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[1] História de Bom Despacho, pg. 15 a 22.

[2] Enciclopédia dos Municípios Brasileiros, 1957, verbete “Bom Despacho”.

[3] História de Bom Despacho, pg. 19/20.

[4] "Dicionário de Bandeirantes e Sertanistas do Brasil", Itatiaia/Edusp, 1989, pgs. 96/97 e 98/102.

[5] Francisco Camacho, homem casado, morador na Picada de Goiases, estava presente na expedição de Pamplona de 1769; fez-lhe até uma poesia jocosa – pgs. 76/77 da Revista ABN nº 108 de 1988.

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