O
gato de Curitiba
–crônicas de viagem e outras histórias |
Na
solenidade de entrega do Prêmio MG TURISMO, no dia
1 de março, a partir das 19 horas, no Othon Palace
Hotel, em Belo Horizonte, a Thesaurus Editora de Brasília
e o Jornal MG TURISMO promovem o pré-lançamento,
em 2a. edição, do livro “O gato de Curitiba
– crônicas de viagem e outras histórias”,
de Jacinto Guerra, coordenador-geral do Caderno MG CULTURA.
Estão convidados os interessados em literatura, especialmente
professores, escritores, jornalistas, educadores e estudantes.
Em
sua primeira edição, o livro de Jacinto foi
publicado em 1994 e lançado, com êxito, em
Belo Horizonte, Brasília e Curitiba, além
de Uberlândia, Bom Despacho e Moema, no interior de
Minas; depois , com apoio da VASP, em Porto Velho, capital
de Rondônia, e Natal, no Rio Grande do Norte.
O
gato de Curitiba recebeu Menção Especial do
Prêmio BDMG Cultural de Literatura, instituído
pelo Banco do Desenvolvimento de Minas Gerais. Em seu relatório
da premiação, os membros da Comissão
Julgadora – Carmem Shineider Guimarães, Duílio
Gomes e José Afrânio Moreira Duarte –
afirmam que o texto de Jacinto Guerra “dá-nos
a impressão de que estarmos lendo uma crônica
a cada manhã, novinha em folha, trazida pelo jornal”.e
que “o cronista escreve com muita facilidade e beleza”.
A
nov a edição, além das crônicas
de viagens a todas as regiões do Brasil, traz os
textos “De Lisboa ao Porto, nos caminhos do mar”,
“Brasileiros na Grécia”, “Os caminhos
de Roma” e “Viagem ao Império dos Incas”.
Com relação ao turismo no Brasil, destaca-se
a recente crônica “Rumo a Porto Velho”
com observações interessantes sobre a lendária
Estrada de Ferro Madeira – Mamoré e o Forte
Príncipe da Beira, erguido pelos portugueses, nos
confins da Amazônia, para assegurar a integridade
territorial do país.
Enriquecendo
o livro de JG, ,o poeta mineiro Anderson Braga Horta, que
recebeu o Prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira
do Livro, publica o ensaio “A moderna crônica
brasileira”, um estudo de especial interesse para
jornalistas, escritores, professores, estudantes e todos
os que desejam utilizar a palavra c om elegância e
clareza.
O
lançamento em Bom Despacho será realizado
em data próxima abrindo as comemorações
dos 40 anos da Biblioteca Municipal, instituída e
inaugurada pelo prefeito municipal, Dr.Roberto de Melo Queiroz,
no dia 7 de setembro de 1964.
O gato de Curitiba – crônicas de viagem e outras
histórias (Thesaurus, Brasília, 2004, 2a.edição,
ilustrado, 186 páginas, capa em policromia , R$30,00)
contato
com Jacinto Guerra: jacinto.guerra@brsturbo.com.br
veja
outro livro de Jacinto Guerra
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Imagens |
capa
e contracapa
o
escritor Jacinto Guerra
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Veja
um trecho do Livro |
Você que sempre desejou ser
um globe-trotter como eu, porém, jamais conseguiu realizar
seu sonho, leia o texto abaixo do notável escritor-jornalista
Jacinto Guerra e, depois, compre seu livro "O gato de Curitiba
- crônicas de viagem e outras histórias", cujo
pré-lançamento está marcado para 1º de
março, em Belo Horizonte. Você jamais dirá que
nunca viajou.
Peque um mapa e acompanhe a rota
Lisboa-Porto, percorrida por Jacinto e deliciosamente descrita em
seu texto. Feche os olhos e, seguramente, você até
sentirá o aroma da santa terrinha.
DE LISBOA AO PORTO, NOS CAMINHOS
DO MAR
JACINTO GUERRA
Como toda gente sabe, mineiro não
perde trem, ainda mais quem é de Bom Despacho e Lagoa da
Prata, cidades que tiveram o fascínio da Estrada de Ferro
e sua Maria Fumaça. Por isto, cheguei bem cedo a Santa Apolônia,
a fim de embarcar no moderno comboio da CP-Caminhos de Ferro Portugueses,
um trem expresso denominado foguete, que deixa Lisboa com destino
ao Porto.
O trem corre à margem do
histórico Rio Tejo, o mar de Palha, de onde partiram as caravelas
da Descoberta do Brasil. Na outra margem do rio, avistamos a cidade
de Almada, com o seu Cristo Redentor que lembra o nosso Rio de Janeiro,
sempre lindo.
Estamos atravessando Alcântara,
uma das zonas mais antigas e interessantes da cidade, na direção
de Belém e do famoso Mosteiro dos Jerônimos, onde se
encontram os túmulos de portugueses notáveis como
Vasco da Gama, Luís Vaz de Camões e Fernando Pessoa.
Mais adiante, a Quinta das Mil Flores, grande e bela residência
do embaixador do Brasil.
Com a rapidez e a eficiência
dos trens europeus, o comboio deixa Lisboa e já estamos no
interior bucólico de Portugal, com suas vilas e cidades que
a gente conhece nos livros de Eça de Queiroz, de Miguel Torga
e de José Saramago: Vila Franca de Xira, Azambuja e a velha
Santarém, onde Pedro Álvares Cabral foi sepultado.
Estamos atravessando a planície do Ribatejo, com extensas
plantações de trigo, milho, girassol, melão
– e as grandes criações de gado bravo, para
as touradas.
No rumo do Noroeste, passamos por
Albergaria dos Doze, São Tiago do Litém, Pombal e
Alfarelos. Depois, entramos no encantador Vale do Rio Mondego. Com
emoção, contemplo a lendária Coimbra, que o
trem expresso deixa para trás e avança na direção
do Serra do Buçaco, já no caminho do mar.
Duas horas de viagem e chegamos
à Costa de Prata, no litoral do Atlântico, neste pequeno
país, onde sempre estamos perto do mar. Atravessamos a planície
onde deságua o Rio Vouga e, à beira-mar, surge a cidade
de Aveiro, cheia de pequenos lagos e canais extensos, a Veneza de
Portugal, terra de lindas praias e céu luminoso como este
de Brasília e de Cristalina.
O trem atravessa uma região
densamente povoada. Ao longo de toda a estrada, vemos pequenas propriedades
rurais: as quintas, bem cuidadas, floridas e verdes. Plantações
de milho, arroz, frutas, hortaliças, extensos pinheirais
e sempre os belos vinhedos. O Norte não precisa de reforma
agrária. É uma região de minifúndios
produtivos, que nos dá a impressão de ter um razoável
padrão de vida rural, muito enriquecido pela proximidade
do mar, com o desenvolvimento da pesca e das atividades de turismo.
Estamos outra vez à beira-mar.
Surgem vilas e praias brancas e limpas: Espinho, Miramar, Valadares
– banhadas pela manhã de sol e cheias de azul do céu
e do mar. (Quem sabe aqui em Valadares, norte do Portugal, estejam
as origens dos Valadares mineiros, entre os quais o empresário
José Celso Valadares Gontijo, engenheiro bondespachense que
construiu, em Brasília, a Ponte JK, premiada nos Estados
Unidos como uma das mais belas pontes do mundo). Como o leitor não
se esqueceu, estamos viajando de trem no litoral norte do Atlântico
português e chegamos a Vila Nova do Gaia, às margens
do Rio Douro, já na entrada da cidade do Porto.
Entramos na majestosa Ponte Dona
Maria Pia – construída pelo engenheiro Gustave Eiffel,
o mesmo que edificou, em Paris, a Torre Eiffel – e atravessamos
o Douro, alcançando a Estação de Campanhã,
antes do meio-dia.
Depois, embarquei num autocarro,
que nos leva até a Praça da Batalha. Para o leitor
ainda pouco familiarizado com o português lusitano, autocarro
é um ônibus urbano. Ando a pé no centro da cidade:
Rua da Madeira, Praça de Almeida Garret, Avenida dos Aliados,
com o monumento a D.Pedro IV, que é o Imperador D.Pedro I
do Brasil. Caminhando pela Praça da Liberdade, vou até
o Posto de Turismo, na Rua do Clube dos Fenianos, onde obtenho mais
informações e um mapa da cidade.
Para fazer turismo de verdade,
é preciso andar a pé, no meio do povo. É o
que fiz no Porto e noutras cidades pelo mundo afora. Volto a caminhar
admirando a bela arquitetura antiga, ruas limpas e tranqüilas
(estamos em 1983...), intenso e variado comércio, jardins
floridos, livrarias, grandes e belos monumentos.Com sua torre central,
o prédio da Câmara Municipal impressiona-me pela imponência
e beleza artística.
Almocei no Restaurante “O
Tripeiro”, na Rua de Passos Manuel, onde peço Tripas
à Moda do Porto. Não se assuste, porque este é
o prato típico da cidade, com feijão branco, tripas
de porco e um delicioso arroz, em porção bem avantajada.
Isto é uma surpresa na culinária portuguesa, já
que, na Europa, come-se muita batata e pouco arroz. Como não
podia deixar de ser, foi um almoço servido a Vinho Verde
da região do Minho, único lugar do mundo onde se produz
esse tipo de vinho.
Os naturais do Porto são
chamados de tripeiros, motivo de orgulho para eles. Trata-se de
uma designação que existe desde o século XV.
Na época das grandes navegações, quando os
portugueses iniciaram a conquista da África, os moradores
do Porto abateram todo o gado da região, reservando a carne
para o abastecimento das caravelas. Ficaram só com as tripas,
dando origem ao saboroso prato e à curiosa denominação
de tripeiros. Depois do histórico almoço regado a
Vinho Verde, saímos da Praça de D.João I, em
luxuoso ônibus de turismo.
Armado de fuzil e baioneta, um
soldado subjuga uma águia, simbolizando a vitória
definitiva sobre as tropas de Napoleão. Trata-se de expressivo
monumento em praça pública, como tantos outros em
Portugal!
Depois de percorrer o centro da
cidade, visitamos o Palácio de Cristal, moderno parque de
exposições em aço e vidro, com belos jardins
e um mirante, de onde se descortinam a cidade antiga e o largo rio.
Atravessamos o Douro pela moderna Ponte da Arrábida, cujo
arco é um dos maiores do mundo – e seguimos para a
Serra do Pilar. De lá, avistamos o majestoso e pitoresco
cenário do Porto antigo. As construções sobem
a colina em forma de anfiteatro. Vemos que muitas casas, em estilo
oriental, são construídas de granito revestido de
gesso, tornando o branco a cor predominante.
Existe na arquitetura do Porto
uma certa influência inglesa. Surge uma combinação
do antigo com o moderno, formando uma policromia com o cinzento
dos edifícios, a cor escura dos telhados, as escarpas de
granito da beira-rio e os belos vasos de flores nas varandas. Dispersos
pela cidade são numerosos os exemplos de arquitetura dos
estilos românico, gótico, rococó e neoclássico.
Um curiosidade: perto do Memorial
da Guerra Peninsular, entre a Rua Júlio Dinis e a Avenida
da Boa Vista, fica o Shopping Center Brasília, simpática
homenagem dos portuenses à capital do Brasil. Nesta viagem,
estivemos ainda na Foz do Douro, no Castelo do Queijo e, passando
pela Avenida do Brasil, chegam os até as praias de Matosinhos
e dos Ingleses.
Em Vila Nova do Gaia, do outro
lado do Rio Douro, visitamos uma das caves do mundialmente famoso
Vinho do Porto. Foi uma experiência inesquecível. As
caves são extensos e sombrios armazéns, onde o vinho
envelhece em grandes tonéis de carvalho.
O turismo transformou as caves
em verdadeiros e sofisticados Museus do Vinho. Assistimos a uma
interessante aula de vinicultura, em português, inglês
e francês. Um mapa luminoso mostra a região dos vinhedos
do Douro, onde se produz a uva para o Vinho do Porto. As uvas são
transportadas de barco no Rio Douro até Vila Nova do Gaia.
No entanto, o melhor mesmo foi a degustação dos vinhos...
Antes da viagem, andei lendo a
respeito desta cidade que a Unesco declarou como Patrimônio
Cultural da Humanidade. Cidade das mais antigas da Península
Ibérica, o Porto nasceu de uma povoação pré-romana
chamada Cale, depois Portucale, dando origem ao próprio nome
do país:Portugal!
É chamada de “Cidade
Invicta”, porque seus habitantes sempre mostraram coragem
e valor na luta contra os mouros, frente aos castelhanos de Felipe
II e contra os exércitos de Napoleão. Por volta de
540, a cidade foi tomada pelos visigodos, que a perderam em 712
para os mouros. Em 997, os cristãos reconquistaram o Porto,
que se tornou a capital do Condado Portucalense. Houve novo domínio
dos mouros até 1092, quando voltou definitivamente ao controle
dos cristãos. Como se vê, o Porto esteve sob domínio
árabe por mais de trezentos anos, deixando sua influência
na cultura luso-brasileira.
Em 1628 e 1661, ocorreram rebeliões
populares contra os impostos excessivos, em 1757, contra o monopólio
do vinho e, 1808, contra a França. O Duque de Wellington
conquistou a cidade em 1809, vencendo as tropas do General Soul.
Em 1832/33, sob o comando de D.Pedro I do Brasil, o Porto resiste
bravamente ao cerco dos miguelistas, consolidando a vitória
dos liberais contra os absolutistas de D.Miguel, irmão do
imperador do Brasil.
Com a morte de D.João VI,
levantou-se o problema da sucessão no trono de Portugal.
Os grupos políticos de idéias mais liberais elegeram
D.Pedro do Brasil com o título de D.Pedro IV. No entanto,
o jovem príncipe não podia ser Rei de Portugal porque
tinha sido proclamado Imperador do Brasil.
Com este episódio, uma brasileira
chegou a ser Rainha de Portugal: a carioca Maria da Glória,
filha de nosso Imperador Pedro I, subiu ao trono, em Lisboa, como
o nome de D.Maria II. O assunto foi estudado, com muita propriedade,
pelo mineiro Ricardo Arnaldo Malheiros Fiúza, descendente
de portugueses de Ponte de Lima, no Minho, e autor de vários
livros sobre Portugal.
Em 1919, os portuenses proclamam
a Monarquia, que se manteve durante poucas semanas. Em 1917, o Porto
foi centro de um levante do Exército, sendo bombardeado durante
três dias pelas forças do Governo.
O Porto é a terra de Tomás
Antonio Gonzaga, o poeta português que participou da Inconfidência
Mineira, foi degredado para Moçambique e teve sua poesia
traduzida para o russo pelo célebre Puskin, um dos grandes
poetas do século XVIII. Gonzaga foi o grande amor de Marília
de Dirceu, uma das mulheres mais famosas de Minas Gerais, pela sua
beleza e seu romance com o poeta. Em Bom Despacho, moram descendentes
de Marília de Dirceu.
Na história contemporânea
das relações Brasil-Portugal, o presidente Juscelino
Kubitschek recebeu grandes homenagens na cidade do Porto, em 1960,
por ocasião das comemorações do V Centenário
do Infante D.Henrique – e em 1963, quando o ex-presidente
foi a Portugal, na condição de senador da República,
para inaugurar em Belmonte um monumento a Pedro Álvares Cabral.
O assunto está no meu livro JK–Triunfo e Exílio
– Um estadista brasileiro em Portugal ( Thesaurus –
Brasília – 1988), em fase de reedição.
Outro livro imperdível para quem se interessa mais diretamente
por literatura, história, política e assuntos luso-brasileiros
é Solo de Clarineta, de Érico Veríssimo, que
tem a democrática cidade do Porto como um dos cenários
mais interessantes, nesta obra que narra uma viagem do escritor
gaúcho a Portugal em plena ditadura de Salazar.
No Porto, nasceu Almeida Garret,
autor de Viagens na Minha Terra, o primeiro romance moderno de Portugal.
Garret foi, também, um dos pioneiros dos estudos do folclore
português. Ramalho Ortigão, escritor e jornalista,
natural do Porto, é autor – em colaboração
com Eça de Queiroz – do romance O Mistério da
Estrada de Sintra.
Falando em gente ilustre da “sempre
leal e invicta cidade do Porto”, lembramos que ela é
a terra do Infante D.Henrique, o cérebro das grandes navegações,
que abriram as portas do mundo moderno – e de Pero Vaz de
Caminha, nosso primeiro cronista, o escrivão-mor da Descoberta
do Brasil. “Um para empurrar as naus, outro dar a notícia
da chegada delas ao Brasil”, como disse Miguel Torga, um dos
escritores mais importantes da Língua Portuguesa.
Perto da cidade do Porto, fica
Braga, a Roma portuguesa, com os famosos santuários do Sameiro
e do Bom Jesus. Bem junto de Braga, a dez minutos de viagem, está
a encantadora Vila Verde, onde existe, na freguesia de Cervães,
o santuário barroco de N.Sra.do Bom Despacho, que os portugueses
chamavam e a Senhora do Sol, padroeira de minha terra.
– Uai, Jacinto, olha o trem!
Veja só que trem danado...
O leitor que me desculpe. Perdido nas lembranças e absorto
em meus pensamentos, quase perco o trem de volta a Lisboa.
Outubro de 2003
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